Quase 40 mil candidatos mudaram declaração de raça em quatro anos
Publicado em 20/08/2024 | 102 Impressões | Escrito por Renato Abreu
Número de alterações caiu em relação ao último pleito, em meio a esforço do TSE para coibir prática
Cerca de 40 mil candidatos alteraram a autodeclaração de cor ou raça nas eleições deste ano, em comparação com a última disputa municipal. Houve uma redução na comparação com as alterações feitas entre 2016 e 2020, o que pode ser explicado por uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tornando mais rígido o procedimento de troca.
Os dados foram atualizados até quinta-feira. Novos pedidos de registro poderiam ser entregues em mídia física aos tribunais até as 19h, prazo final do encerramento desta etapa da campanha.
Em fevereiro, o TSE publicou uma série de resoluções com regras para a eleição deste ano. Uma das inovações foi a determinação de que, caso um candidato mude sua declaração para preto ou pardo, ele seja intimado para confirmar a alteração. Caso haja a admissão de erro, ou não haja manifestação, ele não poderá receber os recursos destinados a candidatos pretos e pardos.
Apesar deste esforço, a prática já ocorreu em 26,2 mil candidaturas, sendo que 19,9 mil candidatos passaram a se declarar como pardos e 6,3 mil como pretos. Por outro lado, 10,9 mil postulantes mudaram o registro para branco. Ainda houve 250 trocas para indígenas.
Ao total, ocorreram 37,9 mil alterações. Em 2020, foram 43,1 mil mudanças em relação a quatro anos. Foram excluídos dos levantamentos os casos nos quais os candidatos não informaram cor ou raça em um dos dois anos comparados.
Neste ano, parte dos candidatos alega que houve um erro na eleição anterior. É o caso do prefeito de São José Do Divino (MG), Geka (Republicanos), que afirma sempre ter se considerado negro.
— Se foi declarado branco (na outra eleição), está errado. Eu não sou branco, não. Sou de família preta. Minha cor é negra mesma — afirma.
A mudança de branco para preto também ocorreu com o prefeito de Nova Venécia (ES), André Fagundes (Podemos), que em 2020. A campanha afirmou à Justiça Eleitoral que foi um erro e solicitou a alteração para pardo — o que também configura uma mudança em relação ao último pleito. Sua assessoria afirmou que ele “se considera pardo em razão da sua história e do seu histórico familiar de pessoas negras na sua família”.
O prefeito de Santo Antônio do Jardim (SP). Neguinho (Podemos), também mudou a declaração neste ano, mas já pediu uma correção. Segundo seu advogado, Valter Domingues, houve um erro devido ao apelido utilizado pelo candidato. “Requer ainda que seja retificada a informação relacionada à cor do candidato, posto que constou erroneamente preto, quando o correto é branco”, afirmou Domingues na petição apresentada.
O vereador Karlyson Rebolça (PL), de Macapá (AP), também afirmou que houve um erro:
— Então foi o partido que errou. Ainda bem que você falou, vou falar para eles. Não estou sabendo disso. Eu sou branco, é só ver minha foto.
Tataraneto de indígena
Parte dos candidatos também passaram a se declarar como indígenas. Foi o que aconteceu com o vereador Osvaldo Maturano (PRD), de Vila Velha (ES), que há quatro anos registrou-se como branco. Ele explica que conheceu melhor sua família e descobriu que seu tataravô era indígena, do povo puri.
— O meu bisavô, eu conheci ele. Meu bisavô é filho de índio, índio mesmo. Minha família é lá de Mutum. Meu tataravô era índio, da raça puri. Vou identificar, até porque é minha origem. Estou colocando com orgulho.
Já a candidata a vereadora Liliane Melo (PT), que concorre em Montenegro (RS), afirmou que houve um erro e que pedirá a alteração.
— Não sou indígena. Eu tenho um grau de parentesco, mas não tenho como comprovar, por isso coloquei branco. Provavelmente (foi erro). Vou pedir para alterar.
Em Salvador, mudanças para branco
Também há o contrário: os candidatos que passam a se identificar como brancos. Isso ocorreu com os dois principais concorrentes de Salvador: o atual prefeito, Bruno Reis (União Brasil), e o vice-governador da Bahia, Geraldo Júnior (MDB), que tinham se declarado como pardos. Em nota, Bruno Reis afirmou que fez isso para não ter acesso aos recursos de candidatos negros. “Como não iria utilizar esse benefício e para não restar qualquer tipo de dúvidas, tomei a decisão de mudar”, diz o texto. Também em nota, Geraldo Júnior alegou que sempre foi “reconhecido pela sociedade como um homem branco e nunca enfrentei qualquer tipo de discriminação ou preconceito racial”.
Na eleição de 2022, o ex-prefeito de Salvador ACM Neto (União Brasil), que concorreu ao governo da Bahia, chegou a se cadastrar como branco, mas depois pediu a alteração para pardo e foi alvo de críticas.
Outras mudanças que ocorreram na disputa foram do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), que mudou de branco para pardo. Já o governador de Santa Catarina, Jorginho Melo (PL), passou de pardo para branco. O senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) chegou a se registrar como branco, mas depois alterou para indígena, como fez em 2018.
Fonte: Portal Geledés